A 3ª Turma da Câmara Superior do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) decidiu, hoje, a favor da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) ao analisar o cálculo do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) que incide sobre mercadorias vendidas por indústria à atacadista do mesmo grupo. A vitória foi por voto de qualidade — desempate pelo presidente da Turma, que é representante da Fazenda.
Apesar de esse ter sido o “leading case” sobre o assunto, o entendimento da Câmara Superior será aplicado a depender de cada caso concreto.
O tema foi julgado em dois processos envolvendo a Procosa, fabricante de produtos L’Oréal. Um deles já havia começado e o outro não (16682.722461/2015-30 e 16682.722760/2016-55).
Neles, a empresa discute a validade de cobranças de IPI para os anos de 2011 e 2012. A Câmara Superior aceitou o recurso da PGFN, mas determinou que os processos voltem para as turmas do Carf analisarem argumentos que não haviam sido analisados quando a decisão era favorável à empresa.
Os leading cases tratavam do conceito de “praça” para cálculo do Valor Tributável Mínimo (VTM). O VTM é o piso para a tributação de IPI quando a empresa fabrica um produto e o revende para uma filial ou atacadista, antes do consumidor final.
Para evitar que as empresas vendam para suas atacadistas ou filiais a valor baixo, o Regulamento de IPI de 2010 (Decreto nº 7.212, de 2010), estabelece que a base para o cálculo do IPI é o VTM. O artigo 195 da norma estabelece que o valor tributável não pode ser inferior ao preço corrente no mercado atacadista da praça do remetente, se o produto for vendido para empresas do mesmo grupo.
A divergência entre os contribuintes e a Receita Federal está no conceito de praça. Para a fiscalização, praça é um conceito comercial, que considera para a base de cálculo do IPI o preço praticado pelo atacado. Já para as empresas, a praça está limitada ao município do remetente que, geralmente, é o fabricante.
No caso de não haver concorrentes na mesma “praça”, segundo a interpretação dos contribuintes, a base do IPI seria calculada com base no artigo 196 do Decreto 7212. Segundo o dispositivo, se não existir mercado atacadista, o VTM deve se basear no custo de fabricação, acrescido dos custos financeiros, de venda, administração, publicidade e do lucro.
No caso concreto, a Receita Federal considerou nas autuações que “praça” era a região entre o Rio de Janeiro, onde fica a indústria, e Duque de Caxias, onde está a distribuidora. Esse foi o entendimento do relator, conselheiro Rodrigo da Costa Possas, representante da Fazenda. Para ele, praça não equivale a município. Além disso, considerou que a indústria vendia quase 100% da produção para a distribuidora que, por sua vez, só revendia produtos dessa indústria.
No voto, o conselheiro afirmou que o valor tributável não pode ser inferior ao preço de venda do adquirente. “Praça tem a ver com mercado”, afirmou.
Para Possas, restringir o conceito de praça a municípios poderia permitir que grandes empresas coloquem seu distribuidor em outro município e aleguem que não existe concorrente na praça, permitindo preços artificialmente inferiores para tributação pelo IPI.
O voto do relator foi acompanhado por outros conselheiros representantes da Fazenda.
Já a conselheira Tatiana Midori Migiyama, representante dos contribuintes, divergiu. Afirmou que a regra para cálculo do VTM estabelecida desde seu nascimento até hoje se manteve inalterada.
Segundo Tatiana, praça significa uma localidade, município, e não uma região inteira. “A expressão praça do remetente denota o local em que opera o industrial”, disse. A conselheira citou precedentes judiciais que consideram “praça” como “município”. A conselheira foi acompanhada pelos representantes dos contribuintes. Com o empate, o processo foi decidido no voto de qualidade.
Além de higiene e beleza, a tese se aplica a outros setores em que a atividade fabril está separada da área de distribuição. O Decreto nº 8.393, de 2015, equiparou atacadistas de alguns cosméticos a industriais, levando o IPI a incidir sobre o valor final da atacadista nesses casos. Apesar dessa mudança, ainda há empresas de cosméticos que discutem o conceito de praça e recebem autuações, segundo advogados.